Determinação do centro de massa de uma peça triangular por meio de partições a partir da mediana
DDeterminação do centro de massa de uma peça triangular pormeio de partições a partir da mediana Determination of the center of mass of a triangular piece bymeans of partitions from the median
José Joaquín Lunazzi Bruno Fontes de Sousa Janeiro de 2021
Resumo
E conhecido o método de se determinar o centro de massa de uma peça triangularpendurando-a por cada um de seus vértices e tracejando as verticais. O ponto de encontrodas três verticais é considerado o centro de massa, o que se verifica colocando a peça emequilíbrio sobre um elemento pontiagudo. O que nem todos sabem é que esse método foidesenvolvido pelo sábio grego Arquimedes há 2300 anos, e que ele o liga à Fig. geométricadas medianas de um triângulo. Ele demonstrou o resultado teoricamente e, inspirado na suademonstração temos desenvolvido uma outra que conduz à ideia e métodos do cálculodiferencial.
Palavras-chave:
Ensino de Física, Centro de massa, Equilíbrio.
Abstract
It is well known the method of determining the center of mass of a triangular piece in which itis hanged from each one of its vertices while drawing from the vertice its verticals. Theintersection of the three verticals is considered as the center of mass, verified by equilibratingthe piece over a point object. But not everybody knows that the method was developed byArquimedes 2,300 years ago, determining the geometrical elements to the medians of thetriangle. He demonstrated theoretically its result and, inspired on his demonstration wedeveloped another one, which lends to the ideia and methods of the differential and integralcalculs.
Keywords:
Physics Education, Center of mass, Equilibrium.
1 Introdução
Está comprovada a dificuldade de muitos alunos em adquirir os conceitos doCálculo Diferencial e Integral (CDI). Um dos motivos é a abstração matemáticageralmente colocada pelo professor. Entendemos que para os alunos de carreirasnão especificamente matemáticas seria melhor partir de conceitos mais ligados aocotidiano dos elementos que o rodeiam, seguindo a pedagogia de Paulo Freire. Edesenvolvendo uma sequência paralela à da história da humanidade, onde IsaacNewton [1] e Gottfried Wilhelm Leibniz [2], foram os primeiros que descobriramindependentemente o cálculo [3]. Arquimedes, com suas engenhosasdemonstrações, resolveu problemas de Mecânica antes mesmo do surgimento doCDI, incluindo até perfis parabólicos, pelo que deve ser considerado um predecessorimportante. ncontrar o ponto de equilíbrio de objetos com forma geométricas simplespode não ser tão simples e levar a desconcertos. Isto pode acontecer até mesmo emdissertações acadêmicas [4]. O Professor André K. T. de Assis [5] comenta que se pode encontrar o ponto deequilíbrio de uma peça triangular pelo método da suspensão pelos vértices. Nocontexto, ele descreve como Arquimedes provou a localização do centro de massausando duas demonstrações por caminhos diferentes. Na primeira delas, ele traçauma mediana e linhas paralelas equidistantes a partir de pontos que resultam dasubdivisão da base. Acompanhando esta demonstração pensamos em partir dafigura de um triângulo escaleno para eliminar toda simetria inicial. Ao longo doprocesso, percebemos que a demonstração podia ser realizada aumentando onúmero de partições para chegar a poder desprezar os elementos menores,constituindo um caminho que facilita a ideia do uso do CDI e a própria demonstraçãodo método clássico de determinação do centro de massa aplicado a objetostriangulares [6].
2 Centro de massa de uma peça triangular
Arquimedes estabelece inicialmente sete postulados. Utilizamos três deles [6],e os interpretamos assim:
Postulado 1. “Postulamos que pesos iguais se equilibram a distâncias iguais (Fig.1a) e que pesos iguais suspensos a distâncias desiguais não se equilibram, mas quese inclinam do lado do peso suspenso à maior distância (Fig. 1b).”
Figura 1: a) Pesos iguais e distâncias iguais. b) Pesos iguais e distâncias diferentes
Postulado 2. “Quando pesos suspensos a certas distâncias estão em equilíbrio (Fig.2a), se adicionarmos algum corpo a um dos dois pesos, os pesos não mais seequilibrarão, mas haverá uma inclinação do lado do peso ao qual foi adicionadoaquele corpo (Fig. 2b).” Figura 2: a) Pesos iguais e distâncias iguais. b) Adiciona-se um peso em um doslados da balança. ostulado 3. “Da mesma forma, se removermos qualquer parte de um dos doispesos que se equilibravam a certas distâncias (Fig. 3a5), os pesos não mais seequilibrarão, mas haverá uma inclinação do lado do peso do qual nada foi retirado(Fig. 3b).”
Figura 3: a) Pesos iguais e distâncias iguais. b) Retira-se um pouco do peso de um doslados
Estendemos estes postulados aos casos da Fig. 4, que colocamos naconsideração do leitor para ele concluir que as situações de equilíbrio permanecemsempre que houver conexões rígidas e de pesos desprezíveis.
Figura 4: Diferentes posições verticais dos pesos.
Como consequência, observando a Fig. 5, se entende que ela é também um caso deequilíbrio. Isto nos leva a entender o conceito de braço de torque, que nas figurassão as distâncias d e d . Figura 5: Equilíbrio com braços de torque iguais.
Na ação de uma força uniforme em todos os elementos do corpo, o raciocínioque foi colocado para o peso, vale para a massa uniforme dele, pela segunda Lei deewton, e passaremos a usar a expressão centro de massa, como forma mais geral,ao invés de centro de peso. Passamos a analisar o caso do centro de massa de umtriângulo acrescentando uma pro posição de Arquimedes.
Proposição 1.
Em todo triângulo, o centro de massa está situado sobre umamediana [6].
Demonstração.
Seja
ABC um triângulo qualquer, conforme a Fig. 6, traçamos amediana relativa ao vértice A, onde D é o ponto médio do lado BC . Figura 6: Mediana do triângulo escaleno.
Arquimedes utiliza o raciocínio de demonstração por redução a um absurdo.Assim, o centro de massa do triângulo
ABC estaria localizado em algum ponto dotriângulo, mas fora da mediana A , sendo X o suposto centro de massa (Fig 11). Figura 7: Localização hipotética do centro de massa.
Vamos demonstrar que o centro de massa do triângulo
ABC está situado sobre amediana AD , adaptando as ideias que Arquimedes usou em sua demonstração.Começamos dividindo a base BC em partes iguais na Fig. 8, usando pontosequidistantes, e traçando por estes pontos segmentos paralelos à mediana AD . igura 8: Partição inicial do triângulo. Traçamos os segmentos
MN, LO e KP, paralelos à base BC (Fig. 9). Figura 9: Partição horizontal do triângulo.
A Fig. 10 apresenta os centros de massa dos paralelogramos determinados pelossegmentos paralelos à mediana e pelos segmentos paralelos à base do triângulo.Arquimedes [6] provou que a localização do centro de massa de cada paralelogramocorrespondia ao cruzamento das linhas ligando os pontos médios dos lados opostos.No apéndice 1, acrescentamos a demonstração de que a localização do centro demassa de um paralelogramo também é a interseção das diagonais. Como ilustramosno paralelogramo que contém o vértice N . Figura 10: Centros de massa das partições realizadas.
A Fig. 11 apresenta a peça pendurada por um de seus vértices, onde o vetor ⃗ g * representa a vertical do lugar, como se fosse um prumo. Indicamos com ele adireção do peso, dada pela gravidade, pela aceleração da rotação da Terra, peloempuxo do ar e por mais algum outro elemento que possa intervir. Não se podedeixar de lado o fato de que a Terra gira, reduzindo em 3% aproximadamente opeso, e fazendo com que a vertical do lugar não aponte ao centro dela . igura 11: Placa pendurada por um vértice. Note-se que a placa pendurada pelo ponto A tem, do outro lado da mediana,para cada paralelogramo um que atua com torque igual e contrário. Isto porque osbraços de torque de um e outro são iguais, sendo eles a distância à mediana.Faltaria provar que o equilíbrio também corresponde se incluirmos as partestriangulares ainda não consideradas. Arquimedes o faz de uma maneira muitoelaborada, e nós também poderíamos o fazer aplicando mais geometria. Vamosporém utilizar um outro raciocínio que vai nos permitir entender o encaminhamentoao Cálculo Diferencial e Integral. Ele consiste em aumentar o número de partições.Dessa maneira vemos que a área total dos setores triangulares resulta cada vezmenor, ficando evidente que poderemos chegar a desprezá-la. Fazendo o númerode partições tender a infinito, a área desconsiderada tende a zero. Provamos assimo equilíbrio da placa em relação a qualquer ponto de sua mediana. Repetindo oprocesso para qualquer um dos dois vértices restantes, localizaremos um únicoponto comum às três medianas [7]. Este ponto comum às três medianas constitui oque chamamos de “centro de massa”.
3 Equilíbrio por um ponto
Note-se que, na Fig. 11, se pendurássemos a peça por qualquer ponto damediana, o equilíbrio dos torques permanece. Se apoiarmos a placa sobre a pontade um lápis no ponto de interseção das três medianas, e tomarmos um elemento depeso qualquer veríamos que ele tem um complemento o equilibrando a respeito decada uma das três medianas. Isto prova que a placa resulta equilibrada?. Esta éuma pergunta interessante para você, leitor, refletir. Sobre o tema, estamoselaborando um novo artigo, a ser publicado [8].
4 Conclusão
Mostramos de maneira didática e também histórica a justificativa para oexperimento simples tão comum de determinação do centro de massa de umtriângulo pendurado pelos vértices. Preenchemos desta maneira uma carência doslivros didáticos. Indicamos um raciocínio que ajuda ao aluno a aplicar a ideia departições em grau crescente para chegar a um resultado exato, que é fundamentodo cálculo diferencial e integral. Outra carência dos livros didáticos que temosidentificado está em não considerar a rotação da Terra na hora de avaliar o peso.Esse erro conceitual está muito presente no cotidiano do ensino de física. Este trabalho leva a considerar o caso mais geral de equilíbrio a respeito dequalquer reta que passe pelo centro de massa, que também pode ser desenvolvidocom a mesma metodologia. gradecimentos
José J. Lunazzi agradece aos alunos de graduação em física que, durante 33semestres, discutiram assuntos de ensino de física com ele nas disciplinas F 609, F709 e F 809 do Instituto de Física da Unicamp. Em particular, sobre centro de massae realizando a construção de balanças diversas e sobre a ideia do peso não serigual a mg. Ao Prof. André K.T. de Assis pelo material disponibilizado gratuitamentena página web [10], pela orientação de trabalho sobre o tema em disciplina deIniciação Científica [11] e pelas opiniões e troca de informações constantes hádécadas. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior-CAPES-MEC que mantém aberto às universidades o acesso a muitas revistasimportantes que, de outra maneira, não teríamos como pagar para ler. A University ofCornell-EUA pela manutenção do repositório de artigos publicados ou manuscritosArxiv que fornece acesso livre a milhões de artigos importantes na área de CiênciasExatas e de Ensino de Física. A rede social mundial gratuita de pesquisadoresResearch Gate, que possibilita a leitura de artigos publicados e de projetos e acomunicação entre os membros.
Referências [1] S. I. Newton,
Princípios Matemáticos da Filosofia Natural (Edusp, São Paulo, 2013)[2] C. S. Roero, in
Landmark Writings in Western Mathematics, editado por I. Grattan-Guinness (Elsevier Science, Amsterdam, 2005)[3] S. W. Hawking e Mlodinow,
Uma nova história do tempo (Ediouro, Rio de Janeiro,2005)[4] R. G. d. Oliveira,
O Baricentro dos Polígonos Convexos . Dissertação de mestrado, Universidade Federal da Bahia, 2016[5] A. K. T. Assis,
Arquimedes, o Centro de Gravidade e a Lei da Alavanca (Apeiron Montreal, Montreal, 2008)[6] A. M. R. da Luz e B. A. Álvarez,
Física (Scipione, São Paulo, 2006), v. 1[7] A. K. T. Assis e F. d. M. Ravanelli, American Journal of Physics 77, 54 (2009)[8] J. J. Lunazzi, B. F. de Sousa, ”Equilibrium of a triangular piece at the meeting pointof its medians” , será publicado.[9] O. Dolce e J. N. Pompeu.
Fundamentos de Matemática Elementar Geometria Plana . (Atual, São Paulo, 2013), v. 9[10] [11] Vicente L. Ventura Seco, Andre K.T. de Assis, “Estudos sobre “O Método” de Arquimedes através da Construção de Balanças e Alavancas”
Anexo 1
A seguir, vamos apresentar a definição de triângulos iguais.
Definição 1.1
Um triângulo é igual (ou congruente, símbolo ≡) a outro se, esomente se, é possível estabelecer uma correspondência entre seus vértices demodo que: . Seus lados são ordenadamente iguais aos lados do outro e 2. Seus ângulos são ordenadamente iguais aos ângulos do outro. [9] Figura 1.1: Igualdade de triângulos
Os triângulos
ABC e A'B'C' são iguais (em símbolos:
ABC ≡ A'B'C' ) se, esomente se: 1) AB ≡ A'B', AC ≡ A'C' e BC ≡ B'C' e 2)
A ≡
A', B≡ B' e C ≡
C' .
Proposição 1.1
Em todo paralelogramo o ponto de interseção das diagonais é oponto médio destes segmentos.
Figura 1.2: Igualdade dos triângulos
ACE e DBE
Demonstração.
Demonstramos que os triângulos
ACE e DBE da Fig. 1.2 são iguais,pelas seguintes relações: 1. E ^ C A ≡ E ^ B D e E ^ A C ≡ E ^ D B, por serem alternos internos de retas paralelas.2. BD ≡ BD , por serem lados opostos do paralelogramo.Daí, concluímos que AE ≡ ED e CE ≡ EB .
Definição 1.2 (Ponto como elemento físico). Consideramos cada ponto como umapartícula de massa e dimensões mínimas, iguais para todos.
Proposição 1.2.
Em todo paralelogramo, o centro de massa (de massa, ou deequilíbrio) é o ponto de interseção das diagonais.
Demonstração.